Covid: MPF recorre de decisão que permitiu reabertura do comércio em Natal
Retomada de atividades não essenciais ocorreu com base em decretos inconstitucionais, com a rede de saúde pública sob pressão e a pandemia ainda longe de ser controlada
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou um recurso contra decisão da 4ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, que manteve a retomada das atividades econômicas não essenciais em Natal. Uma liminar impetrada pelo MPF – junto com MP/RN e MPT/RN – foi negada e o município seguiu o processo de reabertura do comércio, mesmo com base em um decreto inconstitucional e com os dados apontando para o risco de a retomada gerar uma “segunda onda” de casos da covid-19 na capital. A cidade reúne 25% da população potiguar, mas já responde por 42% dos óbitos.
O MPF demonstra no recurso – um agravo de instrumento - que a decisão da Prefeitura em seguir com o plano de retomada das atividades foi inconstitucional, pois desrespeita os limites de sua competência, tendo em vista que normas municipais não poderiam contrariar ou mesmo ampliar as estaduais ou federais, “especialmente em matéria de saúde pública”. Reforça ainda que não deve ser aceita a adoção de medidas administrativas sem fundamentos técnico-científicos consistentes, especialmente em meio a uma situação de crise como a atual pandemia.
“Seja sob a perspectiva do direito nacional, seja sob o ponto de vista do mais autorizado direito estrangeiro, não há qualquer invasão indevida da esfera do poder executivo municipal na presente demanda. Os Decretos municipais impugnados configuram não apenas atos ilícitos que contrariam os mais recentes entendimentos do STF, mas também caracterizam medidas arbitrárias que ignoram seu potencial lesivo à saúde pública”, descreve o recurso.
Já em meio à atual pandemia, decisões do STF confirmaram que as normas municipais devem respeitar o limite dos decretos estaduais e também que desconsiderar parâmetros técnico-científicos configura “erro grosseiro que enseja a responsabilização do agente público”. Esse posicionamento não apenas autoriza, como impõe ao Ministério Público a obrigação de acionar a Justiça quando tais decisões vierem desprovidas dessa fundamentação.
Perigo - O Ministério Público reforça que a decisão da Prefeitura não apresentou fundamentação científica para a reabertura, além de contrariar o decreto estadual e recomendações do Ministério Público. A ocupação de leitos de UTI e semi UTI destinados ao tratamento da covid-19 segue acima de 80% na Região Metropolita do Natal, por vezes superando os 90%, e os índices de transmissão ainda não garantem que a pandemia esteja sob controle.
O objetivo da liminar – negada em primeira instância - era que a Prefeitura do Natal retornasse às medidas de isolamento social vigentes até 29 de junho, adotando o Plano de Retomada somente quando forem observados os devidos critérios técnicos, incluindo uma ocupação abaixo de 70% dos leitos críticos e a queda sustentada da taxa de transmissibilidade.
O MPF cobra ainda apresentação de justificativas técnicas para o início da reabertura, estabelecimento de um protocolo adequado de testagens, adoção de normas de segurança epidemiológica para as empresas (quando houver condições de retomada) e a determinação de horários distintos no funcionamento, reduzindo a quantidade de pessoas nos transportes coletivos.
Negligência - A Prefeitura do Natal já adotou três etapas de reabertura, começando em 30 de junho e ampliando em 7 de julho e novamente no dia 14 deste mês. Para o MPF, essa atitude vem sendo promovida em total “dissonância com as recomendações sanitárias e com o mundo dos fatos” e se baseia – de acordo com nota da Prefeitura - na aprovação de um comitê científico municipal cujos possíveis dados e detalhes sequer foram divulgados.
O Município também alegou que, por não ter participado da fixação das condicionantes de reabertura do comércio, não seria obrigado a cumpri-las. “(...) tal entendimento permitiria a qualquer município desatender regulamentações provenientes do governo estadual, federal e até mesmo de organismos internacionais”, adverte o Ministério Público.
Redução - Para o MPF, ao ceder à pressão para relaxar as ações de isolamento social, o Executivo municipal coloca em risco a população e também pode gerar o prolongamento da pandemia, resultando em prejuízos econômicos ainda maiores. “Autorizar essa abertura, nesse momento, é estimular a morte, o sofrimento e o contágio da população, além de sobrecarregar os profissionais da saúde que estão dando seu suor e sua própria vida para enfrentar uma doença ainda sem cura”
O Ministério Público reconhece que houve uma recente redução no número de pacientes nas filas de espera no estado como um todo (onde mais de 280 pessoas já morreram somente nessas filas aguardando por leitos). No entanto, esclarece que uma decisão racional de reabertura da economia “haveria de aguardar uma consolidação dessa tendência de queda por pelo menos alguns dias”.
Apressar a retomada resultou, em vários locais, em um crescimento dos números da pandemia, exigindo dos governantes novos retornos ao isolamento, inclusive de forma mais rígida. Por isso, o MPF requer que seja promovida – antes de qualquer retomada - uma completa avaliação de riscos, baseada em fatores epidemiológicos como a incidência de casos; quantidade de internações; ocupações de leitos; números de mortes; e o devido monitoramento através da testagem.
Insuficiência – Parte da testagem promovida pela Prefeitura do Natal, aliás, tem sido feita com testes rápidos, que “além de não terem a acurácia necessária, são ineficazes para fazer inquéritos epidemiológicos quando não são definidos critérios (regiões da cidade, população mais afetadas, trabalhadores de determinadas atividades,etc)”.
O número de leitos disponíveis, de equipes de saúde e mesmo a qualidade do material de proteção desses profissionais foram apontados como insuficientes pelo Conselho Municipal de Saúde (CMS). Em junho, o CMS informou que, além de não haver a quantidade de leitos anunciada pelo Município do Natal, os dados a respeito também não vinham sendo inseridos no sistema estadual de regulação, o RegulaRN.
Tribunal - O agravo de instrumento se refere à Ação Civil Pública 0804411-96.2020.4.05.8400 e deve ser encaminhado ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). É assinado pelos procuradores da República Cibele Benevides, Caroline Maciel, Fernando Rocha, Maria Clara Lucena, Rodrigo Telles e Márcio Albuquerque, todos membros do GT-Covid-19 montado pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte.
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou um recurso contra decisão da 4ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, que manteve a retomada das atividades econômicas não essenciais em Natal. Uma liminar impetrada pelo MPF – junto com MP/RN e MPT/RN – foi negada e o município seguiu o processo de reabertura do comércio, mesmo com base em um decreto inconstitucional e com os dados apontando para o risco de a retomada gerar uma “segunda onda” de casos da covid-19 na capital. A cidade reúne 25% da população potiguar, mas já responde por 42% dos óbitos.
O MPF demonstra no recurso – um agravo de instrumento - que a decisão da Prefeitura em seguir com o plano de retomada das atividades foi inconstitucional, pois desrespeita os limites de sua competência, tendo em vista que normas municipais não poderiam contrariar ou mesmo ampliar as estaduais ou federais, “especialmente em matéria de saúde pública”. Reforça ainda que não deve ser aceita a adoção de medidas administrativas sem fundamentos técnico-científicos consistentes, especialmente em meio a uma situação de crise como a atual pandemia.
“Seja sob a perspectiva do direito nacional, seja sob o ponto de vista do mais autorizado direito estrangeiro, não há qualquer invasão indevida da esfera do poder executivo municipal na presente demanda. Os Decretos municipais impugnados configuram não apenas atos ilícitos que contrariam os mais recentes entendimentos do STF, mas também caracterizam medidas arbitrárias que ignoram seu potencial lesivo à saúde pública”, descreve o recurso.
Já em meio à atual pandemia, decisões do STF confirmaram que as normas municipais devem respeitar o limite dos decretos estaduais e também que desconsiderar parâmetros técnico-científicos configura “erro grosseiro que enseja a responsabilização do agente público”. Esse posicionamento não apenas autoriza, como impõe ao Ministério Público a obrigação de acionar a Justiça quando tais decisões vierem desprovidas dessa fundamentação.
Perigo - O Ministério Público reforça que a decisão da Prefeitura não apresentou fundamentação científica para a reabertura, além de contrariar o decreto estadual e recomendações do Ministério Público. A ocupação de leitos de UTI e semi UTI destinados ao tratamento da covid-19 segue acima de 80% na Região Metropolita do Natal, por vezes superando os 90%, e os índices de transmissão ainda não garantem que a pandemia esteja sob controle.
O objetivo da liminar – negada em primeira instância - era que a Prefeitura do Natal retornasse às medidas de isolamento social vigentes até 29 de junho, adotando o Plano de Retomada somente quando forem observados os devidos critérios técnicos, incluindo uma ocupação abaixo de 70% dos leitos críticos e a queda sustentada da taxa de transmissibilidade.
O MPF cobra ainda apresentação de justificativas técnicas para o início da reabertura, estabelecimento de um protocolo adequado de testagens, adoção de normas de segurança epidemiológica para as empresas (quando houver condições de retomada) e a determinação de horários distintos no funcionamento, reduzindo a quantidade de pessoas nos transportes coletivos.
Negligência - A Prefeitura do Natal já adotou três etapas de reabertura, começando em 30 de junho e ampliando em 7 de julho e novamente no dia 14 deste mês. Para o MPF, essa atitude vem sendo promovida em total “dissonância com as recomendações sanitárias e com o mundo dos fatos” e se baseia – de acordo com nota da Prefeitura - na aprovação de um comitê científico municipal cujos possíveis dados e detalhes sequer foram divulgados.
O Município também alegou que, por não ter participado da fixação das condicionantes de reabertura do comércio, não seria obrigado a cumpri-las. “(...) tal entendimento permitiria a qualquer município desatender regulamentações provenientes do governo estadual, federal e até mesmo de organismos internacionais”, adverte o Ministério Público.
Redução - Para o MPF, ao ceder à pressão para relaxar as ações de isolamento social, o Executivo municipal coloca em risco a população e também pode gerar o prolongamento da pandemia, resultando em prejuízos econômicos ainda maiores. “Autorizar essa abertura, nesse momento, é estimular a morte, o sofrimento e o contágio da população, além de sobrecarregar os profissionais da saúde que estão dando seu suor e sua própria vida para enfrentar uma doença ainda sem cura”
O Ministério Público reconhece que houve uma recente redução no número de pacientes nas filas de espera no estado como um todo (onde mais de 280 pessoas já morreram somente nessas filas aguardando por leitos). No entanto, esclarece que uma decisão racional de reabertura da economia “haveria de aguardar uma consolidação dessa tendência de queda por pelo menos alguns dias”.
Apressar a retomada resultou, em vários locais, em um crescimento dos números da pandemia, exigindo dos governantes novos retornos ao isolamento, inclusive de forma mais rígida. Por isso, o MPF requer que seja promovida – antes de qualquer retomada - uma completa avaliação de riscos, baseada em fatores epidemiológicos como a incidência de casos; quantidade de internações; ocupações de leitos; números de mortes; e o devido monitoramento através da testagem.
Insuficiência – Parte da testagem promovida pela Prefeitura do Natal, aliás, tem sido feita com testes rápidos, que “além de não terem a acurácia necessária, são ineficazes para fazer inquéritos epidemiológicos quando não são definidos critérios (regiões da cidade, população mais afetadas, trabalhadores de determinadas atividades,etc)”.
O número de leitos disponíveis, de equipes de saúde e mesmo a qualidade do material de proteção desses profissionais foram apontados como insuficientes pelo Conselho Municipal de Saúde (CMS). Em junho, o CMS informou que, além de não haver a quantidade de leitos anunciada pelo Município do Natal, os dados a respeito também não vinham sendo inseridos no sistema estadual de regulação, o RegulaRN.
Tribunal - O agravo de instrumento se refere à Ação Civil Pública 0804411-96.2020.4.05.8400 e deve ser encaminhado ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). É assinado pelos procuradores da República Cibele Benevides, Caroline Maciel, Fernando Rocha, Maria Clara Lucena, Rodrigo Telles e Márcio Albuquerque, todos membros do GT-Covid-19 montado pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte.
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